Alma carioca, encantada!

Selo do Correio do Rio de Janeiro.
Estou sendo duramente criticado pelos meus pontos de vista com relação a esta nossa identidade "afrancesada", sem originalidade e de tom meramente opaco na cultura de um povo. Os mousieres julgam-me louco inculto, as mademoiselles de insensível e selvagem tropical, no entanto, o refinamento francês é detestável neste processo de autenticidade brasileira.

No início do século XX, o Rio de Janeiro era a capital do Brasil. Foi uma época de replanejamento urbano e regeneração social; as ideias positivistas vinham da Europa para educar um povo que começava a desenhar um rosto. Mas a elegante sociedade carioca quis ver nascer um novo País: a "França dos Trópicos!"

Por aquelas bandas da Gália, também se transformava os hábitos e as cidades. O apuro, a educação adestrada e o asseado conhecimento científico tomavam conta do pensamento intelectual e administrativo da querida Gália...

A meu ver, a razão que levou o governo francês a propor a regeneração urbana de Paris, encarregando o Barão Haussmann de abrir amplos bulevares e avenidas, foi impedir a população de tomar a cidade de assalto, protegendo-se por trás de um cinturão de barricadas e enfrentando violento da polícia. As ruelas estreitas e o calçamento de pedras constituíram o cenário imprescindível dos vários motins, revoltas e Comunas de Paris; os engenheiros urbanos logo o perceberam. As avenidas amplas e asfaltadas tornavam as barricadas praticamente inviáveis e davam total liberdade de ação à força policial.

Não parece, pois, muito casual o fato de o engenheiro Pereira Passos, prefeito do Rio de Janeiro no começo do século XX, capital do país à época, ter estado em Paris e acompanhado de perto a ampliação do novo projeto urbanístico da cidade. Pode-se deduzir, portanto, que a transformação do plano urbano da capital brasileira obedeceu a uma diretriz claramente política, que consistia em deslocar aquela massa temível do centro da cidade, eliminar os becos e vielas perigosos, abrir amplas avenidas e asfaltar as ruas. E, com efeito, a medida mostrou-se adequada. Remédio eficaz, diagnóstico exemplar e efeitos colaterais visíveis na violência e na desigualdade da bela cidade do Rio de Janeiro.

O filme abaixo, de Willian Côgo, retrata um Rio de Janeiro antigo, terra de bons malandros, onde a igreja é ainda respeitosamente vira da para costa e o CR Vasco da Gama é a representação desta vida romântica, encantada no tempo passado; pois que, hodiernamente, perdeu sua alma pueril. Não há mais os “cariocas-da-gema” andando pela Zona Portuária, assim como não há uma identidade brasileira autêntica neste eterno País do futuro. Resta-nos apenas recordar... Mas dizem que recordar é viver!


Por Ricardo Novais
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