Imagem de arquivo.
Cama
desfeita, célere amor...
|
A cama redonda era o ninho da lascívia. O teto e as paredes
espelhadas eram o rudimentarismo do prazer. Eu beijava Cecília com o afeto
simbiótico da cobiça. Tinha lampejos de consciência, o resto todo era desejo.
Lá do box embaçado do banheiro ela me chamava. Aclamação química!
O vapor da água quente se misturando à fragrância do sabonete vagabundo, ao
gozo dos perfumes dela e à respiração deleitosa. Cecília, de costas. A água
temperada caindo sobre nós. Eu mais juntinho a ela, beijando-lhe a nuca, alva,
buliçosa; tudo num afago sexual... Não imaginas, leitor, como aquela mulher era
provocante, com grandes olhos castanhos maliciosos pedindo para satisfazê-la, querendo
me engolir, e estes gestos trançados a sinais delicados e elegantes. Cecília
era quase natural. Naquele momento encontrei minha companheira eterna; naquele
momento encontrei meu Nirvana, o ápice que me libertou.
No aconchego do enlace íntimo e indomável, não consegui conter o
coração vilipendiado. É que o cheiro da volúpia era tanto maior que o cerne
sentimental. Coito vasto, concupiscente, sedento, perturbador de todos os
pontos nevrálgicos da luxúria. Órgãos humanos libidinosos, ora expostos ora entrecobertos,
à meia-luz, sob clarividência da paixão pervertida. Fomos molécula, micha,
mucosa, placenta, asqueroso pus... Tudo nutrindo nossos corpos, nossos corpos
nus. Era um cruzar de pernas e movimentos atingindo labirintos entre brumas
despidas.
- Sou insaciável, cachorro! – ela gritava-me em toque de ordem irresistível.
– Vem meu cachorro, vai! .... ... ..! Vai!
- . ..? Ah, ......! ........!
Penetração carnal, suja, violenta; e ao mesmo tempo terna, afetuosa,
apaixonante! Ela jogada de quatro no chão de carpete marrom-claro vulgar,
espremida do espelho manchado de reflexos extravagantes; eu com a musculatura e
ideias que poderiam muito bem ter durado a eternidade, mas que foi breve tremor
de artérias túrgidas. Preservativos que não usamos. E nossos corpos
entrelaçados, num bater de joelhos deleitoso, em sussurros que ora viravam
urros de prazer ora eram simplesmente gritos de um amor fugaz, quase estéril. Não
couberam ali fingimentos de preliminares, gestos turgescentes e disposições
sexuais – fomos o próprio orgasmo.
- .... ... ..! Vai! .... ... ..! Vai! .... ... ..! Vai!
De repente, em meio aos filmes eróticos, às músicas de cabaré
francês e à sombra esparramada de dois amantes, Cecília percebeu mensagem
urgente. O marido a procurara mais cedo em casa. Saímos de nosso ninho
voluptuoso às pressas, derrubando lençóis ao íntimo carpete marrom-claro e
ainda deixando um gosto impudico às taças de amor abandonadas pela metade.
Querida leitora, acredite-me; não conto aqui uma aventura vil de
autor depravado. Oh, não, senhorita leitora minha. Relembro-me tão-somente o
esplendor da sensualidade de minha amiga mais perigosa e enigmática, pois foi
exatamente este dos meus casos o que jamais consegui esquecer – e não esqueço!
Alcancei a alma infinita, porém maculada. Sinto falta do rugido sedento de
Cecília, com seus grandes olhos castanhos lúbricos e provocantes. E só digo
isto, nada mais.
Por
Ricardo Novais