Pintura de Andreas Mantegna (1460). |
Há uma pessoa que sofre
muito, mas não está mais na idade de sofrer. Quase todas as coisas a fazem
sofrer, exceto as coisas próprias do sofrimento. Não, não está morta esta
pessoa, não ainda. Também não padece de doença grave, dívida irrecuperável ou
amor completamente despedaçado. No entanto, como sofre este ser desgraçado.
Não sabe como é triste,
leitor, sofrer por coisas que não são de sofrer. Mas como? Como? Deve sofrer
tanto? Não lhes respondo com certeza, amigo e amiga que me leem, mas tamanho
sofrimento parece-me fora de hora e de causa. Sofrer por sofrer, sofrer por
ofício. Eis o imponderável.
O conto é tão calmo, apesar
de tamanha aflição e sofrimento estéril, que o encerro antecipadamente
neste parágrafo, revelando, entretanto, a identidade deste sofredor sem causa e
efeito: és tu, leitor, que sofre na mesma medida e propósito do autor que vos
escreve.
Por Ricardo Novais
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