Desenho de Flávio Augusto Bazani Cruz.
Ganhei um sagui de porcelana em tamanho natural, uma réplica do animal. Agradeci o presente e sorri como pude.
Pareceu-me um macaquinho absurdo, mas a pessoa que me presenteou estava tão
entusiasmada que fingi imensa alegria com o mimo.
Agi com pura sociabilização.
Menti, portanto. Não me recrimines, dona leitora. Ninguém poderia mesmo viver
com alguém que dissesse a verdade habitualmente... Confesso, eu minto entre
duas e três vezes em uma primeira conversa de dez minutos com um novo conhecido
e triplica se for amigo ou rifa de longa data. Minto porque há
público. Minto porque os outros existem. Minhas mentiras crescem atingindo o
extremo da falsidade, a impostura. Para isso é preciso cálculo, vontade de
enganar, muita energia, engenhosidade, memória e provavelmente muito tempo. É
assim que consigo ocultar minha própria identidade e cimentar uma nova sobre
uma grande farsa.
Às vezes, pergunto-me o que
há por trás de um impostor? Por que arrisco tudo por uma invenção aparentemente
desnecessária?
Sempre concluo disto que, desde
o dia 15 de Novembro de 1889, sou tão-somente um ordinário exemplar, bem sintomático,
desta República a qual pertenço; pedantemente galicista e ideologicamente positivista.
Por todos os lados, procuro poder, sexo e dinheiro. Sou grande mentiroso! Aí está
toda a causa de minha virtude... hipócrita.
Quanto ao sagui de porcelana,
assim que o ganhei maquinei, secretamente, jogá-lo no lixo e o mais prático foi quebrá-lo à
marteladas.
Por
Ricardo Novais