A Paixão do Amor


Shoes, óleo sobre tela de 1888. Pintura de Vicent Van Gogh.

Amor. Como explicar tal sentimento? Se é que é um sentimento. Não sei o que é o amor... Não este amor que vai se reduzindo ao usufruto do desejo contraditório. Por estes nossos bailes impera o amor polido, de boas maneiras e de aparências. O amor poderia ser como a arte e a cultura que se instalaram nos conventos na Idade Média, naquela época, ao menos, buscavam a sua essência. Mas, hodiernamente, ao contrário dos tempos medievais, o amor vagabundeia por aí, percorrendo estes nossos salões, a esmo, confuso... Coitado! Contudo, enfim, é o amor!

E o que fazer quando um afetado pelo amor deixa de amar primeiro que o outro que ainda não curou? Um supera, mas e o outro? As consequências da vida são sutis... Apesar de tudo, o amor ainda calça seus sapatos e vai passear à noite.

Nesta semana, depois de conversa definitiva com a paixão e a confirmação dos papéis de divórcio entre os dois, o amor não saiu do bar. Ora; mas se foi, exatamente, nesta semana categórica que ocorreu o encontro de tais sentimentos... Perceba que este tal encontro, que poderia ser num parque ordinário, num vagão de trem do metrô, em uma igreja prosaica ou dentro de cabina de elevador dum prédio de escritórios qualquer, é o fundamento da confissão de vida estróina e fracassada do sentimento.

A essência é o amor, já que as coisas confessadas pela paixão nada mais são que o próprio amor. Amor achado, utilizado e perdido. John Lennon, Sammy Hagar e Waldick Soriano podem ter tido semelhantes influências naquele rock inglês triste, chuvoso e procurando... pelo amor.

Também por amor a alma se perde a cada dia. Mas, durante todos estes dias que ainda lhe restará, a alma estará à procura deste nobre sentimento e, mesmo que nunca o encontre, persistirá vivendo, ao menos, sob o signo da paixão.

Já o amor quer porque quer enterrar os seus entes queridos, entretanto, talvez sua sincera esperança seja enterrar as paixões que continua sentindo, posto que a velha vida que leva agora já não lhe reconheça mais, e, assim, vai à caça de algum pensamento passado que não arranja jeito de encontrar. Que um dia lhe seja concedido o purgatório das almas desalentadas!

O leitor que queira abandonar o texto pensando estarmos muito atolados na lama; peço-lhe que, por favor, espere um momento. Aguente um pouco mais, já estamos caminhando para o exato momento onde o amor descalça seus velhos sapatos e descansa, um pouco... Além disso, em vosso respeito, mudarei o rumo da prosa.

Assim, para não continuar aborrecendo o bravo cavaleiro com palavras melosas e vexando o espírito da castas damas com maus pensamentos, também para fechar a tampa do caixão desta paixão doentia do amor, apenas me valho do poema de Carlos Drummond de Andrade:

“A cada dia que vivo / mais me convenço de que o desperdício da vida / está no amor que não damos / nas forças que não usamos / na prudência egoísta que nada arrisca / e que esquivando-nos do sofrimento / perdemos também a felicidade. / A dor é inevitável / O sofrimento é opcional.”

Enterramos assim a paixão desencantada. Oh, mas e quando é amor?

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Por Ricardo Novais

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