Crônica: A indolência do caso Robinho

 

A visão de Clarice.


Para o torcedor santista o caso Robinho é bem impactante. Não me cabe julgá-lo, mas a Justiça sim; e esta o condenou por um crime terrível. Embora não me incumba aqui o papel de jurista, moralista ou analista de notícias da imprensa, o crime de Robinho não atingiu apenas a vítima do estupro coletivo, é um dolo na alma de toda mulher, uma vez que desperta um gatilho de todo o machismo secular impregnado na sociedade. Atinge as mulheres de maneira psíquica e nos homens causa reflexão, pelo menos, deveria; deveria causar algum amadurecimento de personalidade e caráter – talvez, chegar à sensatez e ao equilíbrio.

 

Eu não sei se o cidadão Robson de Souza vai amadurecer; torço para que sim, que o faça e que recupere a sua dignidade, independentemente de estar sendo, somente agora, obrigado a pagar pelo que fez. Eu digo isto neste parágrafo e escrevi um grande prenúncio, no parágrafo anterior, para deixar claro que aqui, nas parvas linhas deste texto, estou querendo emitir a minha impressão de torcedor, torcedor do do Santos Futebol Clube, sobre o atleta Robinho; ainda porque, como já disse, não vou meter o nariz nas decisões judiciais, mesmo acertadas, e não sou moralista para “chutar cachorro morto”. Portanto, o caso Robinho é uma mácula para quem é torcedor santista.

 

Robinho foi o maior protagonista do título mais importante para Santos dos últimos 40 anos; ele foi o “Rei das Pedaladas”. O título do Paulista de 84 é um marco na memória de quem viu, e de quem não viu também, pois era o "último triunfo alvinegro". Dezoito anos depois isso foi quebrado. Em 2002 os Meninos da Vila recolocaram o Santos Futebol Clube no caminho das glórias, de onde sempre teve presença cativa e eterna, e o jogador Robinho foi como um anjo pedalando em nuvens, dentro dos sonhos do torcedor que sofria há tantos anos; sim, o futebol não me parece só um esporte, é, por vezes, uma poesia que amortece as angústias da vida.

 

Mas e agora, torcedor peixista? Eis que o jogador Robinho se transformou em anjo caído na história do clube e de todo o desporto; se negar os seus feitos históricos e conquistas pelo Santos Futebol Clube e pelo futebol é uma tarefa quase impossível, também é provável que jamais algum torcedor, apaixonado santista ou não, com um mínimo de consciência de vida e de caráter, possa declará-lo ídolo do esporte ou de lugar algum; ora, a justiça é para todo mundo, para a sua esposa, para a sua filha, para a sua mãe, para todas as mulheres que têm os seus direitos desrespeitados e suas honras atacadas todos os dias.

 

Por Ricardo Novais

Equilíbrio

O grande bar, de Alberto Sughi.

Não eram dez horas ainda, mas a noite parecia acabada. Ah!, leitor, uma noite encerrada precocemente é como o amor sem o gozo. A cidade é feita para se apreciar, sair de casa, andar a pé pelo bairro, parar em um bar. Preencher a vida com rostos desconhecidos de todas as cores e idades.

Parei em frente ao bar do Juarez, não entrei. Fiquei a olhar com insegurança as ruas ao redor, cheias de bares apinhados de gente, homens e mulheres desconhecidos fumando nas calçadas, copos tilintando beijados pelas mesmas bocas, bocas transmitindo as mesmas conversas. Não eram dez da noite.

Entrei no bar. Pode dizer-me ambíguo, leitor. Fui direto ao balcão, bebi uma dose e chegou uma mulher. Fomos para uma mesa nos fundos do bar, a única que vagou rápido. Em cinco minutos, eu olhava para uma mulher em prantos acusando-me de crápula; não julgue à toa, dona leitora; a coisa pareceu-me triste, a noite terminando precoce...

Há muito tempo, um velho bruxo dizia que existem pessoas que choram pelos espinhos na rosa, mas há outras que sorriem porque entre os espinhos colhem-se as rosas. Possível que o pensamento não seja deste jeito tão rude, mas é que não tenho a elegância daquele bruxo, e também porque a paciência da escrita deste tempo é mais curta do que outrora.

Sim, fui um crápula. Saí do bar. Sozinho. A mulher ficou, solitária, terminando a cerveja sem álcool à espera de alguma boa companhia. Andei pelas mesmas ruas entre os mesmos bares apinhados de gente de todas as idades. Entre todos os desencontros, encontrei boa companhia em pub de ladrilho descacado. Bebemos, rimos, cantamos; bebemos outra vez... A noite precoce estendeu-se um pouco mais, e mais, até que virou dia.

- O que você está pensando?

- Na bebida colorida desta cidade!

- É tão simples...

Há coisas que me fascinam demasiadamente. Os sorrisos fracos entre os goles de cerveja e a névoa do cigarro que não se fuma pesam às costas daqueles que se conhecem bem, entretanto, entre aqueles que tenham se visto pela primeira vez há poucos instantes todo momento é único e futuro.

- É tão simples...

Enquanto alguém lamenta, caro leitor e querida leitora, outra ri; o mundo é perfeito. Seria um tédio só se tudo fosse lágrima, mas também sorriso o tempo todo seria fútil e débil. Não acha? O equilíbrio é a felicidade da vida, em sua variedade humana, entre lamúria e dança, ressaca e impulso; um copo sendo cheio por uma garrafa brilhante em um bar qualquer desta megalópole barulhenta, cinza e de passos anciosos.

Por Ricardo Novais
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