Ataque das Formigas

Havia um criador de formigas no interior de São Paulo revoltado com o governo. Quanto mais ele investia no cultivo de formigas, mais lhe cobravam impostos.

Cidadão respeitador, sempre pagara suas obrigações em ordem. No entanto, vivia a pensar: “Este país não dá o devido valor ao bem medicinal que proponho com minhas formiguinhas!”.

Diziam-no tolo, quando não louco, mas ele via naquela ciência o arbítrio que arrola a razão humana. “São todos cegos, é a cegueira da falta de razão”, assim julgava ele a todos os seus críticos.

Viveu deste modo singular durante 20 anos, sempre cumprindo suas obrigações de cidadão brasileiro. "Ordem e Progresso", também este era o seu lema. A sua vida quase toda foi em honra a este lugar e a este povo; e às formigas, claro!

No entanto, como verdadeiro homem lúcido que prevê as desgraças de tempos em tempos, percebeu que o montante de suas dívidas vieram, devagarzinho, sobrepor-se às suas convicções. Pior: chegavam já a ameaçar a vida de suas formigas. Passou a condenar seus credores, via neles o comportamento que se erige em verdade absoluta e, em nome desta, cometiam distorções inaceitáveis.

O governo era seu maior credor, ele devia impostos altíssimos. Impotente diante de tal monstro, ele articulou um plano popular que vencesse um exército convencional. Contudo, universalmente os homens são ordeiros, mas têm julgamentos particulares e mudam de bando, portanto, difícil recrutar soldados para tamanha revolução. Foi, então, que decidiu ser o general de um exército de formigas.

Como comandante e também comandado do próprio batalhão, estrategicamente, viu-se num plano ousado. Não que ele quisesse desagradar os patriotas, coitados! Mas ele já não acreditava em ninguém e em mais nada; e cá entre nós, meu amigo leitor, se não são os crédulos os mais criativos? Portanto, este homem cético, porém sonhador, resolveu atacar a base do órgão de imposto de renda do Estado.

Este conspirador, de quem aqui conto a história, serviu à aeronáutica em tempos passados, os tempos nervosos do ‘Araguaia’. Piloto mediano, ele tinha lá seus contatos dentro da instituição das forças armadas.

A noite veio, dormiu. Antes de o sol ameaçar a lua, as formigas já estavam dentro de uma caminhonete verde muito antiga e grande rumo à São Paulo. Viajou quase 500 km exaustivamente. Chegou à capital paulista às 13h58min. Foi direto para o Campo de Marte onde cumprimentou um dos únicos homens sob à face da Terra que lhe devia alguma coisa nesta vida; ora, o suborno é uma coisa muito agradável! Adentrou à aeronave com todo o seu ‘material de guerra’. Fez reverência ao outro oficial que lhe ajudara no préstimo do avião e decolou. Sobrevoou por 40 minutos o centro da cidade, olhou o frontispício da Catedral, do Edifício Altino Arantes, mirou no prédio da Fazenda e colidiu à altura do 5° andar. Houve grande explosão!

Morreram em batalha as dívidas do comandante e junto com elas os seus sonhos; feneceu também um cartorário que acabara de declarar os bens; e, desgraçadamente, do exército das pobres formigas sobreviveu apenas uma. No socorro aos feridos, um oficial dos bombeiros ainda comentou ao colega: "As formigas são mesmo traiçoeiras e corruptas"... O outro ponderou: "E resistentes!".

FIM.

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O conto que acabei de narrar é pura ficção, mas, às vezes, as pessoas se revoltam tanto contra as autoridades e, de fato, ousam contra seus algozes. Assista abaixo a matéria de um evento trágico ocorrido ontem no Texas, Estado Unidos, com um cidadão desiludido com o próprio país e desgostoso com as regras da sociedade:



Por Ricardo Novais









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